quarta-feira, 21 de setembro de 2011

A crença de que a felicidade é um direito tem tornado despreparada a geração mais preparada.

ELIANE BRUM

Ao conviver com os bem mais jovens, com aqueles que se tornaram adultos há pouco e com aqueles que estão tateando para virar gente grande, percebo que estamos diante da geração mais preparada – e, ao mesmo tempo, da mais despreparada. Preparada do ponto de vista das habilidades, despreparada porque não sabe lidar com frustrações. Preparada porque é capaz de usar as ferramentas da tecnologia, despreparada porque despreza o esforço. Preparada porque conhece o mundo em viagens protegidas, despreparada porque desconhece a fragilidade da matéria da vida. E por tudo isso sofre, sofre muito, porque foi ensinada a acreditar que nasceu com o patrimônio da felicidade. E não foi ensinada a criar a partir da dor.

Há uma geração de classe média que estudou em bons colégios, é fluente em outras línguas, viajou para o exterior e teve acesso à cultura e à tecnologia. Uma geração que teve muito mais do que seus pais. Ao mesmo tempo, cresceu com a ilusão de que a vida é fácil. Ou que já nascem prontos – bastaria apenas que o mundo reconhecesse a sua genialidade.

Tenho me deparado com jovens que esperam ter no mercado de trabalho uma continuação de suas casas – onde o chefe seria um pai ou uma mãe complacente, que tudo concede. Foram ensinados a pensar que merecem, seja lá o que for que queiram. E quando isso não acontece – porque obviamente não acontece – sentem-se traídos, revoltam-se com a “injustiça” e boa parte se emburra e desiste.

Como esses estreantes na vida adulta foram crianças e adolescentes que ganharam tudo, sem ter de lutar por quase nada de relevante, desconhecem que a vida é construção – e para conquistar um espaço no mundo é preciso ralar muito. Com ética e honestidade – e não a cotoveladas ou aos gritos. Como seus pais não conseguiram dizer, é o mundo que anuncia a eles uma nova não lá muito animadora: viver é para os insistentes.

Por que boa parte dessa nova geração é assim? Penso que este é um questionamento importante para quem está educando uma criança ou um adolescente hoje. Nossa época tem sido marcada pela ilusão de que a felicidade é uma espécie de direito. E tenho testemunhado a angústia de muitos pais para garantir que os filhos sejam “felizes”. Pais que fazem malabarismos para dar tudo aos filhos e protegê-los de todos os perrengues – sem esperar nenhuma responsabilização nem reciprocidade.

É como se os filhos nascessem e imediatamente os pais já se tornassem devedores. Para estes, frustrar os filhos é sinônimo de fracasso pessoal. Mas é possível uma vida sem frustrações? Não é importante que os filhos compreendam como parte do processo educativo duas premissas básicas do viver, a frustração e o esforço? Ou a falta e a busca, duas faces de um mesmo movimento? Existe alguém que viva sem se confrontar dia após dia com os limites tanto de sua condição humana como de suas capacidades individuais?

Nossa classe média parece desprezar o esforço. Prefere a genialidade. O valor está no dom, naquilo que já nasce pronto. Dizer que “fulano é esforçado” é quase uma ofensa. Ter de dar duro para conquistar algo parece já vir assinalado com o carimbo de perdedor. Bacana é o cara que não estudou, passou a noite na balada e foi aprovado no vestibular de Medicina. Este atesta a excelência dos genes de seus pais. Esforçar-se é, no máximo, coisa para os filhos da classe C, que ainda precisam assegurar seu lugar no país.

Da mesma forma que supostamente seria possível construir um lugar sem esforço, existe a crença não menos fantasiosa de que é possível viver sem sofrer. De que as dores inerentes a toda vida são uma anomalia e, como percebo em muitos jovens, uma espécie de traição ao futuro que deveria estar garantido. Pais e filhos têm pagado caro pela crença de que a felicidade é um direito. E a frustração um fracasso. Talvez aí esteja uma pista para compreender a geração do “eu mereço”.

Basta andar por esse mundo para testemunhar o rosto de espanto e de mágoa de jovens ao descobrir que a vida não é como os pais tinham lhes prometido. Expressão que logo muda para o emburramento. E o pior é que sofrem terrivelmente. Porque possuem muitas habilidades e ferramentas, mas não têm o menor preparo para lidar com a dor e as decepções. Nem imaginam que viver é também ter de aceitar limitações – e que ninguém, por mais brilhante que seja, consegue tudo o que quer.

A questão, como poderia formular o filósofo Garrincha, é: “Estes pais e estes filhos combinaram com a vida que seria fácil”? É no passar dos dias que a conta não fecha e o projeto construído sobre fumaça desaparece deixando nenhum chão. Ninguém descobre que viver é complicado quando cresce ou deveria crescer – este momento é apenas quando a condição humana, frágil e falha, começa a se explicitar no confronto com os muros da realidade. Desde sempre sofremos. E mais vamos sofrer se não temos espaço nem mesmo para falar da tristeza e da confusão.

Me parece que é isso que tem acontecido em muitas famílias por aí: se a felicidade é um imperativo, o item principal do pacote completo que os pais supostamente teriam de garantir aos filhos para serem considerados bem sucedidos, como falar de dor, de medo e da sensação de se sentir desencaixado? Não há espaço para nada que seja da vida, que pertença aos espasmos de crescer duvidando de seu lugar no mundo, porque isso seria um reconhecimento da falência do projeto familiar construído sobre a ilusão da felicidade e da completude.

Quando o que não pode ser dito vira sintoma – já que ninguém está disposto a escutar, porque escutar significaria rever escolhas e reconhecer equívocos – o mais fácil é calar. E não por acaso se cala com medicamentos e cada vez mais cedo o desconforto de crianças que não se comportam segundo o manual. Assim, a família pode tocar o cotidiano sem que ninguém precise olhar de verdade para ninguém dentro de casa.

Se os filhos têm o direito de ser felizes simplesmente porque existem – e aos pais caberia garantir esse direito – que tipo de relação pais e filhos podem ter? Como seria possível estabelecer um vínculo genuíno se o sofrimento, o medo e as dúvidas estão previamente fora dele? Se a relação está construída sobre uma ilusão, só é possível fingir.

Aos filhos cabe fingir felicidade – e, como não conseguem, passam a exigir cada vez mais de tudo, especialmente coisas materiais, já que estas são as mais fáceis de alcançar – e aos pais cabe fingir ter a possibilidade de garantir a felicidade, o que sabem intimamente que é uma mentira porque a sentem na própria pele dia após dia. É pelos objetos de consumo que a novela familiar tem se desenrolado, onde os pais fazem de conta que dão o que ninguém pode dar, e os filhos simulam receber o que só eles podem buscar. E por isso logo é preciso criar uma nova demanda para manter o jogo funcionando.

O resultado disso é pais e filhos angustiados, que vão conviver uma vida inteira, mas se desconhecem. E, portanto, estão perdendo uma grande chance. Todos sofrem muito nesse teatro de desencontros anunciados. E mais sofrem porque precisam fingir que existe uma vida em que se pode tudo. E acreditar que se pode tudo é o atalho mais rápido para alcançar não a frustração que move, mas aquela que paralisa.

Quando converso com esses jovens no parapeito da vida adulta, com suas imensas possibilidades e riscos tão grandiosos quanto, percebo que precisam muito de realidade. Com tudo o que a realidade é. Sim, assumir a narrativa da própria vida é para quem tem coragem. Não é complicado porque você vai ter competidores com habilidades iguais ou superiores a sua, mas porque se tornar aquilo que se é, buscar a própria voz, é escolher um percurso pontilhado de desvios e sem nenhuma certeza de chegada. É viver com dúvidas e ter de responder pelas próprias escolhas. Mas é nesse movimento que a gente vira gente grande.

Seria muito bacana que os pais de hoje entendessem que tão importante quanto uma boa escola ou um curso de línguas ou um Ipad é dizer de vez em quando: “Te vira, meu filho. Você sempre poderá contar comigo, mas essa briga é tua”. Assim como sentar para jantar e falar da vida como ela é: “Olha, meu dia foi difícil” ou “Estou com dúvidas, estou com medo, estou confuso” ou “Não sei o que fazer, mas estou tentando descobrir”. Porque fingir que está tudo bem e que tudo pode significa dizer ao seu filho que você não confia nele nem o respeita, já que o trata como um imbecil, incapaz de compreender a matéria da existência. É tão ruim quanto ligar a TV em volume alto o suficiente para que nada que ameace o frágil equilíbrio doméstico possa ser dito.

Agora, se os pais mentiram que a felicidade é um direito e seu filho merece tudo simplesmente por existir, paciência. De nada vai adiantar choramingar ou emburrar ao descobrir que vai ter de conquistar seu espaço no mundo sem nenhuma garantia. O melhor a fazer é ter a coragem de escolher. Seja a escolha de lutar pelo seu desejo – ou para descobri-lo –, seja a de abrir mão dele. E não culpar ninguém porque eventualmente não deu certo, porque com certeza vai dar errado muitas vezes. Ou transferir para o outro a responsabilidade pela sua desistência.

Crescer é compreender que o fato de a vida ser falta não a torna menor. Sim, a vida é insuficiente. Mas é o que temos. E é melhor não perder tempo se sentindo injustiçado porque um dia ela acaba.

ELIANE BRUM
Jornalista, escritora e documentarista. Ganhou mais de 40 prêmios nacionais e internacionais de reportagem. É autora de Coluna Prestes – O Avesso da Lenda (Artes e Ofícios), A Vida Que Ninguém Vê (Arquipélago Editorial, Prêmio Jabuti 2007) e O Olho da Rua (Globo).
E-mail: elianebrum@uol.com.br
Twitter: @brumelianebrum

sábado, 3 de setembro de 2011

A leitura em casa. Ler para as crianças.


A comunidade leitora que pretendemos que as crianças participem não está só na escola. Ler não é algo que faz parte apenas desse universo. Lemos para nos divertir e nos emocionar entre outras coisas. Porém, observamos que, à medida que as crianças vão crescendo, é comum que os pais deixem de compartilhar esses momentos com seus filhos, afinal, agora eles já podem ler sozinhos. Aquelas deliciosas leituras ao final do dia, muitas vezes, deixam de existir apostando em uma “leitura autônoma” por parte das crianças.

Não podemos esquecer que o gosto pela leitura não se dá somente pela fluência leitora, mas também pelas conversas compartilhadas sobre o livro lido. Além disso, o valor que esses momentos têm para as crianças parece deixar de existir quando elas vão crescendo e a leitura passa a ser algo só da escola e não de um momento agradável com a família.

Assim como discutimos filmes, shows, exposições e programas de televisão, os livros sugerem novas descobertas e novos olhares a partir de diversos pontos de vista, que contribuem para a formação de um leitor literário.

Os temas de interesse mudam, o entendimento de mundo se modifica, os olhares são acompanhados de argumentos vinculados ao que já foi construído ao longo de seu percurso leitor e suas experiências individuais, mas os leitores grandes e pequenos ainda esperam o bom e velho aconchego das pessoas reunidas, dos parceiros de leitura.

Por Andréa Tambelli e Viviane Rei

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

“Mãe, eu vou com você e os meus amigos?”

2ª INTEGRAÇÃO – G1 E G2


Num sábado de clima incerto, com previsão de frio e chuva, acreditamos no sol, ou melhor nas nuvens, e fomos passear no Zoológico. Em nossa 2ª Integração, pais e professoras do G1 e G2, vivenciaram a alegria e a curiosidade gostosa dos pequenos ao visitarem o ZOO da Quinta da Boa Vista.

Acordamos cedo, arrumamos bolsinhas e mochilões, nos encontramos no local marcado, embarcamos. O grupo se forma e vai modificando o clima daquele sábado previsto para ser cinza. Cores, gargalhadas, olhares atentos e muita expectativa começam a concretizar a proposta daquele dia. Integrar. Conviver.

E compartilhar dos interesses que ajudaram a escolher aquele local que visitamos. Os bichos são mesmo sensacionais. As crianças, de fato, têm muito a nos ensinar quando desde cedo manifestam diversas inquietações e vem exigir de nós a responsabilidade em conhecer saberes tão delicados. E científicos.

 - “Por que o bumbum dele é vermelho?”

- “Ele gritou porque  não gosta de viver trancado na jaula.”

- “Claro que ele está nadando, tá o maior calor.”

- “Aquilo não pode ser um hipopótamo, é muito pequeno !” ( só as orelhas e parte da cabeça apareciam, pois o bicho estava todo coberto pela água, que não era transparente.)

- “Todos esses animais estão em extinção?”

- “Por que o pinguim nada?”

- “Olha o iglu dos pinguins que maneiro!”

- “Eu sei porque o nome dela é girada, é porque o pescoço gira muito.” (girafa)

- “Ela carrega o filhote nas costas.”

- “O urubu rei é o Rei dos urubus.”

- “Eu conheço uma parlenda de coruja.”

-“ Posso doar minha tartaruga para o Zoológico?”

- “As tartarugas amam os jacarés?”

- “Eu não vi nenhuma aranha! Não tem aranha neste Zoológico?”

Podemos não saber as respostas para todas essas perguntas, mas temos como dever permitir que nossos filhos e alunos vivenciem a busca incansável e prazerosa por esses e tantos outros saberes. E temos que estar por perto, acompanhando, oferecendo ajuda, acreditando em suas descobertas e desafiando-os  para outras mais complexas. Sim, eles são capazes e estão ávidos por esse momento.

Querem participar, ouvir, duvidar, comprovar. E nos enchem de orgulho, afinal, estão crescendo. Crescimento traz aprendizados e conquistas.

E aprender em grupo é tão gostoso! Podemos integrar saberes e descobrir tantas coisas necessárias à convivência de diferentes pessoas  e ideias.

E por isso queremos agradecer a  todos que participaram do nosso passeio e àqueles que, embora não puderam participar, também acreditam na importância dos saberes compartilhados e do papel do outro na arte de conviver e aprender.

Até a próxima!

Equipe Vivinfância

sexta-feira, 15 de julho de 2011


FÉRIAS! O que vamos fazer?


BASQUETE NO BALDE

Tentar acertar a bola dentro de um balde ou de um cesto de lixo vazio é uma espécie de jogo de basquete improvisado. Essa brincadeira pode ser feita no quintal e as crianças treinam coordenação, além de despertar possível interesse pelo esporte.

Todos juntam as mãos, palma com palma. O passador da vez vai 'cortando' as mãos dos outros até deixar, discretamente, o anel em uma delas. Então, pergunta a um dos jogadores com quem está o anel. Se o jogador acertar, é o próximo passador.

FANTASIAS
Um sapato maior, um lenço comprido, aquela meia bem colorida, a maquiagem da mãe, a gravata do pai, um casacão, muitos colares. Suas roupas antigas ou os acessórios que se acumulam aos montes em
casa viram brincadeira nas mãos das crianças.

É boa pedida para se fantasiar no Carnaval, mas a brincadeira pode acontecer o ano todo: vale imitar os pais ou criar um personagem. Só depende da imaginação...



DANÇA DAS CADEIRAS
Separe uma cadeira a menos do que o número de participantes. Faça uma roda com os assentos virados para fora. Coloque a música e peça para as crianças dançarem ao redor delas. Quando a música parar, elas devem se sentar. Quem não conseguir sai do jogo e leva uma cadeira consigo. Assim continua até que sobre apenas um participante: o vencedor.





ADOLETA!
Em uma roda, os participantes colocam a mão direita sobre a mão esquerda do seu vizinho, com a palma para cima. O primeiro bate a mão direita na direita do vizinho. Quem recebe o tapa repete o feito e assim vai, a cada sílaba cantada, até o final da cantiga. O último a levar o tapa sai do jogo. A cantiga é: "A-do-le-tá/ Le peti/ Le tomá/ Le café com chocolá/ A-do-le-tá".
Também podemos:
INVENTAR HISTÓRIAS – cada um tem 15 segundos para continuar da onde parou.
CONSTRUIR – com caixas de leite ou de suco, cola e criatividade! Que tal fazer um grande castelo ou uma torre...depois pode até pintar!
FAZER MASSINHA de farinha, água e guache
FAZER UMA PINTURA – num papel grande, numa camisa branca, num pedaço de papelão ou numa tela.
FAZER UM SHOW – quem quiser assistir tem que pagar ingresso. Escolher uma música para ensaiar uma coreografia com parte do grupo.
BRINCAR COM JOGOS DE MESA – quebra-cabeça, dominó, jogo da memória, jogo da velha.
BRINCAR DE COZINHEIRO COM CULINÁRIA DE VERDADE – receitinhas fáceis como sanduíches, brigadeiros, biscoitinhos doces ou salgados, pizzas...
FAZER UM PIQUE: PEGA-PEGA – quem for pego vira estátua e uma pessoa precisa libertá-lo encostando nele.
LER LIVROS!
BRINCAR DE FAZ DE CONTA – usar acessórios, fantasias, mudar os móveis de lugar e muita imaginação.
FAZER CORRIDA DE SACO OU DE OVO NA COLHER!

Quem chegar por último...
... é a mulher do sapo! Toda criança gosta de apostar corrida. Se for pulando dentro de um saco, é mais divertido.  Compre sacos grandes de algodão em um supermercado ou armazém, escolha um espaço amplo e marque as linhas de saída e chegada. Tome cuidado com os tombos.

terça-feira, 24 de maio de 2011

“Mas ele queria tanto” “Foi só dessa vez, da próxima vou me manter firme”.



Quando o assunto é limite arranjamos várias explicações para justificar porque cedemos às vontades de nossas crianças, mesmo com a convicção de que essa não seria a melhor atitude.

Mas por que será que isso acontece? Por que, por vezes, não conseguimos manter uma posição contrária ao desejo de nossos pequenos?

Para que eles parem de insistir (e olha que eles são craques nisso)? Para que não fiquem chateados? Para que não fiquem bravos com a gente? Para que não sofram?

Se alguma dessas perguntas teve um “talvez” como resposta, precisamos relembrar os motivos que “estão por trás” de nossas atitudes quando precisamos colocar limites.

Eles são fundamentais para o desenvolvimento de nossas crianças na medida em que oferecem segurança para terem novas experiências. É porque confiam que não vamos soltá-las antes do tempo que experimentam tirar as rodinhas da bicicleta. É porque sabem que estamos por perto para protegê-las que se arriscam nas novidades do crescimento.

Muitas vezes, na tentativa de poupar as crianças do sofrimento, desejando proporcionar todas as experiências possíveis e impossíveis para serem felizes a todo instante e tentando dar o melhor para elas, corremos o risco de sermos protetores ao extremo e tratarmos nossas crianças como se fossem muito frágeis. Este pode ser um caminho para o “nascimento” de um “reizinho mandão” em casa.

Faz parte de nosso papel como educadores, colocar limites e faz parte (em algumas situações) do papel das crianças, tentar burlar, não aceitá-los de imediato, fazer “caras feias”, “bicos de mau humor”. Precisamos estar preparados para isso, tendo a certeza que a sustentação dos limites é necessária para que tenham a oportunidade de aprender a lidar com as frustrações e conviver socialmente de forma mais harmoniosa.

E por mais que no fundo realmente seja muito difícil ver nossos pequenos (às vezes já nem tão pequenos assim) chateados, frustrados e bravos sabemos que tudo isso será fundamental para que eles possam, considerando opiniões diferentes da suas, enfrentar desafios, se arriscar diante de situações mais complexas…

Desta maneira, a relação que estabelecemos com as crianças pode favorecer o crescimento ou apenas se tornar um espaço para livrá-la de um suposto “sofrimento” momentâneo.

Érica Ditolvo

sexta-feira, 20 de maio de 2011

As mães que nos desculpem, mas não comemoramos o seu dia aqui na escola.

Por Dayse Gonçalves

Estamos no mês das comemorações pelo dia das mães. Muitas escolas levam as datas comemorativas muito a sério – as chamadas efemérides – e chegam a alterar a rotina escolar, gastando parte de seu precioso e escasso tempo com a realização de tarefas que pouco valor formativo têm para as crianças. Hoje, por exemplo, data em que escrevo este post, tem gente comemorando o “Dia do Índio”. Em algumas escolas as crianças produzem desenhos de índios, voltam para casa com uma pintura no rosto ou um usando um cocar. Quando muito, alguma informação relevante sobre a cultura indígena.

Fico numa tristeza danada quando penso no lugar que algumas temáticas ocupam no currículo escolar quando o critério de seleção de conteúdo é o calendário, por exemplo! Mas isto é outro problema.

Voltando às mães, preciso dizer: o fato de não lhes rendermos homenagens na forma de pequenos presentes não significa que não reconheçamos sua importância. Pelo contrário. Por reconhecermos sua grande importância – na sociedade e na família -, cremos ser desnecessário agradá-las organizando comemorações que vão exigir sua presença num horário em que a maioria de vocês está envolvida com suas atividades profissionais, das quais, com certeza, a maioria inclusive se orgulha. Sem falar que nossa função é de fato outra.

Lembrei-me de um episódio, ocorrido há alguns anos, quando uma mãe queridíssima me telefonou para dizer o quanto estava triste por não ter sido lembrada pela escola, enquanto as mães dos colegas de condomínio de seu filho exibiam envaidecidas os presentes construídos nas aulas de Arte. Ficamos um bom tempo conversando sobre o assunto. Chegamos então às transformações sociais e, por extensão, às transformações pelas quais vem passando a família pós moderna. Chegamos às famílias monoparentais, às homoparentais, as famílias nas quais as crianças não convivem com suas mães ou já as perderam.

É curioso, não é mesmo? A sociedade muda e a escola não muda! Já não é hora de nos libertarmos de velhos padrões e também de muitos preconceitos? A propósito, não temos que ensinar isso a nossos alunos?

Para finalizar, proponho a leitura de uma divertida crônica de Adriana Falcão que encontrei na internet. Depois de lê-la verão que estão justificadas todas as declarações e demais manifestações de amor que recebemos todos os dias de nossos filhos, através dos desenhos e bilhetinhos carinhosos que nos deixam, dos muitos beijos e abraços, que valem muito mais que qualquer bem de consumo que as lojas insistem em vender no mês de maio.


Um dia de mãe

Chegou exausta, cheia de sacolas, dor de cabeça, morta de calor, faminta, caótica, e com um firme propósito: tomar um banho e cair na cama. Encontrou uma acalorada discussão a respeito da impossibilidade de dividir um computador em três (sem despedaçá-lo) e as três crianças aos berros. Todas as luzes da casa estavam acesas. A pressão subiu um pouco.

– Vocês querem fazer o favor de apagar as luzes enquanto eu tomo o meu banho?

Inútil. Todos os membros da família foram acometidos da síndrome de pensar em outra coisa, mal muito comum entre maridos e filhos durante reclamações, queixas, opiniões etc.
Saiu pela casa desligando tudo que estava aceso para o nada: lâmpadas, som, TV, internet…

– Por isso que eu liguei pra cá e só deu ocupado o dia inteiro!

– O quê?

Nada. Já tinha desistido de competir com o walkman fazia muito tempo.

No quarto da filha mais velha, dezenove blusas, cinco saias e quatro vestidos estavam espalhados em cima da cama para devida apreciação da mesma.

– Vai sair?

– Desisti. Não tenho roupa.

A pressão subiu vertiginosamente. Bobagem. Nada que um banho não resolvesse.

– Esse jantar não sai hoje não?

Esquece o banho.

– Sopa de novo?

Calma.

– Ergh!

Respira.

– Por que eu não tenho copo?

Palpitação moderada. Coisa controlável. Foi buscar o copo.

– Aproveita que tá na cozinha e frita um ovo pra mim?

Claro. Fritar ovo inclusive é uma ótima terapia ocupacional pra quem já passou por dois engarrafamentos, banco, pediatra, ginástica, supermercado, uma papelaria entupida de mães comprando material escolar e cinco reuniões de trabalho. Normal.

– Você não sabe que eu só gosto de gema mole?

Teve uma leve síncope nervosa, mas conseguiu se controlar. Afinal, a culpa era dela. Como podia ter cometido um erro tão grave? É óbvio que a mais velha e a do meio gostavam de gema mole (muito sal para a primeira, pouco para a segunda), a menor preferia ovo mexido (sal no ponto), o marido não suportava gema… Ou não suportava clara? Quem gostava de omelete? Qual das crianças teve sarampo? Quem foi que quebrou a perna?

Bateram na porta. Era o porteiro, pra avisar que ia faltar água. Ameaça de infarto. Passou, graças a Deus. Voltou quando alguém espatifou a jarra de suco no chão. (Dessa vez foi de miocárdio.) A menorzinha disse que foi a mais velha. A mais velha disse que foi a do meio. A do meio disse: tudo eu! E se trancou no quarto, de onde só saía em último caso, um incêndio ou um telefonema, por exemplo. O telefone tocou.

– Alguém pode atender enquanto eu limpo o chão ou limpar o chão enquanto eu atendo?

Todos os membros da família foram acometidos de um acesso de paralisia generalizada (espécie de praga que costuma ser causada pela presença da mãe no recinto) acompanhado de mudez instantânea. Acontece. Ela atendeu ao telefone, era engano, limpou o chão, voltou para a mesa, a sopa tinha esfriado. Melhor. Comer engorda.

– O ar-condicionado do meu quarto quebrou.

– Você se lembrou de comprar o meu livro de inglês?

– Não tem geléia não, é?

– O cachorro fez xixi na minha colcha.

– Por que eu não tenho garfo?

O telefone tocou de novo. Nova palpitação seguida de falta de ar súbita. Era para a menor.

– A Júlia pode dormir aqui hoje?

Pode.

– A mamãe deixou. Desce daqui a dez minutos que a gente passa aí pra te pegar.

Ligeiro formigamento no braço esquerdo. Angina? Isquemia? Talvez. Saiu de casa com o firme propósito de pegar a Júlia, voltar correndo, ir direto tomar um banho e cair na cama.

– Aproveita que vai sair e passa na locadora pra devolver os filmes.

– Aproveita que vai passar na locadora e compra o meu remédio na farmácia.

Casa da Júlia. Locadora. Farmácia. Ia ter de deixar o infarto e o banho pra mais tarde.